19 de mai. de 2011

DL2011 - O Livreiro de Cabul

Antes de resenhar o livro, deixe-me dizer que não sou fã de livros-reportagem porque me envolvo demais sabendo que a história não é uma ficção, que as coisas realmente aconteceram e que vou me emocionar junto com as pessoas reais que fazem parte da história. Por isso, fujo de ler livros-reportagem, pois normalmente são livros que não mostram o lado bonito das coisas.

O que pode acontecer se uma jornalista norueguesa correspondente de guerra resolve partilhar da vida cotidiana dos afegãos? Este é o mote de O Livreiro de Cabul.


Asne Seierstad fez a cobertura da guerra da Aliança do Norte contra o Taliban e depois foi até Cabul onde conheceu Sulthan Khan, um importante livreiro afegão (o mais antigo do país). Deste encontro com Khan, surgiu a idéia de Asne para vivenciar e revelar o cotidiano do povo afegão. E o que pode dar quando uma mulher ocidental resolve viver 3 meses com a família de um muçulmano convicto? Asne vestiu-se de burqa e compartilhou os segredos, as histórias e o dia-a-dia da família de Sulthan Khan.

Sulthan Khan é um homem culto, elegante e charmoso. Muçulmano convicto, livreiro em Cabul, tem uma família tradicional com duas esposas, filhos, irmã, mãe... E foi assim, engraçado e atraente, que Asne o conheceu na época pós-Taliban (época em que todos no Afeganistão estavam mais felizes e muito mais livres, mas o tradicionalismo e a cultura ainda imperavam).

Em uma terra onde a maioria das pessoas são analfabetas, Khan era culto e falava o inglês de forma correta e culta. Na casa de Khan, sua irmã Leila também falava o inglês com certa facilidade, o que facilitou a experiência de Asne. Leila foi minha personagem preferida. É a faz tudo da família. Cuida da mãe, cuida de todos, com submissão, e ainda era eventualmente maltratada, principalmente pelo primeiro filho de Khan, Mansur, que a fazia de empregada da casa.

Com tanta gente na mesma casa, Sultan comandava a todos com tradicionalismo e na sua ausência, todos eram comandados pelo homem mais velho (na sequência), que neste caso era Mansur, o filho primogênito. Este tinha um desejo de ser um homem livre como qualquer ocidental.

Entre os lamentos da primeira esposa, com a chegada da segunda esposa de Sultan (mais jovem e mais bonita), com histórias que parecem de filme. Casamentos arranjados, segredos, paixões, guerra e lágrimas, Asne foi aprendendo a conviver como uma mulher afegã e descobriu porque o Afeganistão é ao mesmo tempo rico e pobre.

Descobriu também como é bom ser uma mulher ocidental, já que no Afeganistão, além das sufocantes burqas, as mulheres podem ser mortas por motivos simples e não comandam sua própria vida, vivendo de forma submissa e aceitando tudo passivamente enquanto sofrem caladas.

Foi uma experiência e tanto e acredito que todo jornalista deveria vivenciar algo assim quando se encontra em um país diferente do seu.

Detalhe: 
O nome do livreiro não é Sultan Khan na verdade, mas sim Shah Mohammed Rais. E na verdade, Asne não apenas contou a história de forma lírica, mas também acrescentou elementos ficcionais para tornar a história um pouco diferente da vivenciada. Shah depois do lançamento do livro de Asne, foi à Noruega processar Asne por não ficar satisfeito com o resultado do livro. O que também foi uma jogada de marketing da parte dele, que logo após lançou seu próprio livro "Eu sou o livreiro de Cabul" e conseguiu uma publicidade extra para a sua REDE de livrarias. Ah! Não conseguiu nada no processo contra Asne justamente por conta dos elementos ficcionais adicionados a história real.

8 comentários:

Li Castro disse...

Uia, menina, não sabia que ela tinha mesclado ficção no livro... Li tão sem vontade que achei chaaato! Rs.
É interessante a nível de conhecimento de cultura, mas não gostei do estilo dela... E tbm não gosto de livro-reportagem!

Bjoos e ótima resenha!

Palavras Vagabundas disse...

Foi justamente por ela colocar elementos ficcionais que a crítica especializada caiu de pau. Inclusive essas passagens invalidaram o livro como reportagem.
abs
Jussara

Medéia (Carlena) disse...

Oi Jussara
Pois é... só descobri depois sobre os elementos ficcionais.
Como eu sabia que havia uma "resposta" (o livro do livreiro) quando terminei de ler procurei notícias sobre o livro e sobre a autora, foi aí que descobri estas informações sobre o processo que ela levou e sobre os elementos ficcionais (que não dizem exatamente quais partes são).
Mesmo assim, eu gostei de ler. Afinal eu li antes de saber de tudo isto e só enriqueceu quando eu soube de tudo o que houve após a publicação.
Abs

Vivi disse...

Hummm...tô pensando aqui: será que leio? De uma coisa sobre livros-reportagens, eu sei: oportunizam aproximações com realidades distintas da nossa, né? Ótima resenha, queridaça!

Beijocas

Kézia Lôbo disse...

esse livro é bom, não curti muito a maneira da escritora colocar os fatos, mas é interessante!

Paulo Cesar disse...

O bestseller de Asne Seierstad é vendido como um "livro de reportagem" e sua autora uma "jornalista norueguesa" o que dá aval ao conteúdo do livro como sendo um retrato das experiências de sua acolhida no seio de uma família afegã. Em seu prefácio ela diz ter alterado o nome das pessoas para não expô-las, mas comete o erro crasso de misturar ficção e reportagem. Como não expor alguém mudando apenas o nome, mas informando quantas esposas tem, onde mora, quem mora na casa, para onde viaja, quem são seus filhos etc. Não deve ser sempre que uma família afegã recebe e hospeda em sua casa um estrangeiro que está escrevendo um livro. Se a grande maioria da população é privada de eduação, não deve ser difícil encontrar um bem sucedido livreiro em Cabul.

Shah Mohammed Rais (o livreiro de Cabul) está correto em indignar-se com o resultado da obra pois independente de verdade ou ficção e se ele quer ou não publicidade para suas lojas (Asne pensava diferente ao lançar um livro?), a personagem Sultan Khan remete diretamente a Shah Mohammed Rais, afinal a autora é uma jornalista e "uma observadora austuciosa e lírica da vida doméstica afegã ... O Livreiro de Cabul pode ser lido como romance, e é uma reportagem empolgante." (The New York Times)

Meu veredito: como escritora, a autora fez uma bela reportagem. Como jornalista fez um péssimo livro.

Anônimo disse...

Eu amei!!! Foi o primeiro livro que li sobre a situação das mulheres no Oriente, principalmente no Afeganistão. Depois deste li A cidade do sol, que diferente por ser totlamente ficcional, também narra a vida submissa e injusta das mulheres nestas regiões.
Recomendo este livro, inclusive já presentei amigos com ele.
Parabéns pelo blog, Medeia!!!

verovamp disse...

li o livreiro de Cabul e achei muito interessante...
Agora ¨Eu sou o livreiro de Cabul¨ achei fraco e desinteressante, uma tentativa frustrada do autor de mudar a própria imagem, sem sucesso...se vendeu foi por pura curiosidade de quem leu o Livreiro de Cabul...